terça-feira, 15 de novembro de 2011

Sobre a mãe e filha de ontem


São Paulo, 15 novembro, 2011


"Eu queria
captar o impercebido
nos momentos mínimos do espaço
nu e cheio" A.C.C.

Sobre a mãe e filha de ontem


Pela primeira vez, no passar das duas, senti em 17 anos, saudade da minhã mãe
Saudade de ter o braço magro onde ela poderia encontrar os próprios dedos ao me
atravessar a rua pelo punho.

O seu jeito de tratar de barrinhas de cereal e geleia de algas como guloseima
e salgadinhos e bolachas como cadeias carbônicas similares ao plástico, isopor ou pvc.
prazeres inatingíveis a minha meninice

No passar das duas, apesar de cabelos e faces tão diferentes,
eu vi a gente, passando pelas ruas de outro lugar, com sacolas da nickey,
recheadas por roupas de personagens educativos, poucas e caras, e que com o tempo,
se tornariam rotas e menos mágicas, ao passo que eu cresceria, me aproximando das outras duas.

Até chegar em hoje, onde todas as roupas são das três, e que as vezes até as roupas da mãe vestem, em uma mistura de desapego e arrependimento, no empréstimo fraternal de diferentes peças pelos mesmos corpos em diferentes gerações.

Em uma mão a menina em outra a sacola, agora entendo porque minha mãe não me deixava segurar.
Embora eu quisesse me orgulhar de carregar roupas tão bonitas, minhas pernas demasiado finas, trombariam em joelhadas e arrastões a sacola que minha mãe provavelmente já imaginava onde iria reutilizar: carregando as provas das suas alunas.

Minha mãe que já mudou a cor do cabelo, mudou de peso, mudou de companheiro, mudou de emprego e de lugar.

E as filhas mudaram o cabelo, mudaram o peso, mudaram de escola, cresceram, e carregam sacolas, nem tantas quanto a mãe gostaria, nem tanto quando deveriam.

Já não comemos salada antes da comida, nem acreditamos que salgadinho é isopor.
Mas compreendemos a preocupação com a comida, hoje, ao redor da nossa barriga!

Não aprendemos a arrumar a casa, a fazer com calma, a fazer sozinhas, a não gritar de nervoso,
esses não foram os valores da nossa mãe.

Aprendemos a gostar de ler, a gostar de joias, de conversar e a não ter preconceito.
aprendemos a falar a verdade, a se despedir das idades, não olhar com maldade, nem quando doí.

Aprendemos a conversar com ela, só não aprendemos a nos comover, com os seus dramas shakespearianos, carmina burana, novela mexicana, com dor nas costas real.

Penso nos botoes de Madri perola dos casacos pequenos de chochê, penso nas tardes de livraria, de andar de patins do quintal da vó maria, penso em a gente voltando do sacolão, procurando sombra para sardas pintadas de gerações que nos confere certo ar de esperteza.

E conferem a pele aspereza, que ano a ano se misturam aos poros e rugas, as memórias, muitas e únicas, entre as varias marcas minhas e da minha mãe.


LMCGA

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