quarta-feira, 27 de maio de 2015

A janela do meu quarto
outra vez

na outra calçada

uma mulher
velha

caminha

me sento para escrever sobre como essa mulher velha caminha em frente a janela do meu quarto

eu olho sempre a minha rua e a minha cidade e essa velha
daqui da janela do meu quarto

imagino que se eu pudesse ver
da janela da vizinha do ventilador de madeira

do outro lado da rua

o mundo se revelaria de outra maneira

sim

sim o céu mudaria de cor

eu descobriria a rotina de outros velhos mendigos esquizofrênicos


mas eu estou ainda aqui no meu quarto

e sentei para falar sobre como caminha a velha

que passa de noite pela minha janela


a primeira vez foi a primeira vez

sentei no pé da cama e me preparei para ver um espetáculo incrível

uma pessoa que caminha devagar

ela anda devagar

ela é torta

ela é pobre

é louca sim

mas de repente o espetáculo acaba e ela some na esquina

pra fora do meu campo de visão

a velha é uma fraude

sempre me chama atenção pelo seu caminhar aparentemente lento

mas quando olho

ela quase corre

ela corre lentamente

atravessa o quarteirão em menos de dez segundos

ela se arrasta correndo

nada se desentorta

nada se move da cintura para cima

ilusão de ótica

nunca nenhum espetáculo de dança contemporânea poderia apresentar nada parecido

estelionatária

as vezes a vejo passar e não olho de raiva

as vezes volto para procurar e ela já sumiu

ninguém nunca vai entender

e assim todos os dias

ela priva todos nós

de todo o mais que eu poderia dizer.



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