domingo, 27 de dezembro de 2015

amanhã eu vou visitar a minha avó.

minha avó, aos  93, diz que o único que lhe olha nos olhos com dignidade é seu bisneto que há pouco completou seis meses de vida. eu espero minha mãe dizer para eu ir vê-la. felizmente ultimamente ela não diz quase nunca. quando diz me dói e uma vez ou outra eu me disponho. torço que para abrir a porta ela demore, um tanto que me garanta uma escusa para eu ir embora. eu não tenho dignidade para encarar a profundidade dos sentimentos da minha avó moribunda e desesperada para dizer me das coisas que aprendeu no último século. eu até gosto de ouvir, quase sempre não me esqueço das suas palavras. minha avó me faz muitos pedidos. me pede para viver. para ser gente, e não velho nesse mundo. eu passo a bola mais porque não quero, do que porque não posso, mas de fato também não posso ajudar. eu fico perguntando onde minha mãe encontrou tanta dignidade para não colocar a minha avó num asilo. elas estão me educando. minha mãe grita. quero dizer que ela está errada, mas eu sou só uma visita. olho para o chão e quero ir embora. penso em comprar alguma coisa para minha avó. me atiro na zona de conforto com toda gravidade. deixo o coração pesar sobre a cama. penso na minha avó chorando e não sei mais explicar porque não consigo me compadecer ao ponto de dedicar a ela um pouco mais da minha juventude. nada importa o que ela foi, se fez o bem ou o mal, é gente velha e desamada. penso em comprar alguma coisa para ela. olho para os lados com medo de encontrar dentro de mim a compaixão.está certo, tudo bem, amanhã eu vou visitar a minha avó.


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