quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Luiz não combinou com os russos - Cap.2 Sem soltar as mãos.

(Alguns dias antes)

Mamãe lhe amassou o rosto, ele gostava disso, desse carinho exagerado, de sentir as bochechas quentes da mãe na sua... Mas naquele dia ela estava nervosa, Luiz sentia o coração dela bater forte durante o abraço, o pai também o abraçou.  Já perto da porta o pai deixou uma lágrima chorar dos olhos. Ninguém conseguiu dizer nada. Tudo tão rápido como algo que não pode estar certo. O avô o tomou pela mão, mas sem nenhuma ansiedade.

A mãe havia colocado em duas mochilas, roupas, brinquedos, objetos de higiene e materiais escolares, com as mãos tremendo de amor e medo. Luiz observava as mochilas no canto do sofá florido de rosas e margaridas, as malas lhe preocupavam o peito, sentiu o coração querer parar, tontura, enjoo, mas não se moveu, sentiu como se alguém lhe friccionasse a garganta, tentou falar e não conseguiu. Ressentimento. Olhos vazios. Desfocou as mochilas, mas seu avô percebeu a partir da direção de sua cabeça que estavam subindo sem levar as coisas, mandou Luiz pegar as malas,  mas ele não ouviu. Tempo. O avô engoliu seco, e disse de novo:

-Luiz, pega suas coisas pra a gente subir e dormir – E desta vez completou com as palavras mágicas -  vai dar boa noite para sua avó.


O tempo rasgava o avô por dentro, o micro tempo entre suas próprias palavras, entre elas e o Luiz, entre tudo que as palavras não poderiam explicar, e tudo que Luiz sentia sem poder entender consumiam o velho, fazendo seu sangue ferver. Tudo muito triste, a avó era sempre uma estratégia de convencimento, mas pela primeira vez Luiz entendeu seu avô, entendeu como a saudade maltrata o coração. Sem soltar as mãos, pegou uma das mochilas, vô Bernardo a outra e subiram para dar boa noite à vovó.